É praticamente impossível calcular quantas decisões homens e mulheres de negócios tomam todos os dias -- desde as mais triviais até as mais complexas. Pressionados pelo tempo escasso e por um colossal volume de informações, muitas vezes esses executivos e empreendedores têm dificuldades na hora de identificar e dedicar-se às questões que realmente importam. Para duas das maiores autoridades mundiais em liderança, os professores Noel M. Tichy, da Universidade de Michigan, e Warren G. Bennis, da Universidade de Southern California, porém, é essa capacidade de discernimento que determina o sucesso ou o fracasso dos profissionais. A longa experiência de ambos com o desenvolvimento de líderes mostra que a maioria raramente enxerga o que é relevante em meio à turba de assuntos que surgem a todo momento e não valoriza o processo decisório como deveria. "Há executivos de mais deixando suas organizações afundarem enquanto se ocupam com trivialidades", alertam no livro Judgment -- How Winning Leaders Make Great Calls ("Decisão -- Como líderes bem-sucedidos tomam grandes decisões", em tradução literal), recém-publicado nos Estados Unidos e sem previsão de lançamento no Brasil.
As decisões mais difíceis
Segundo os autores, as escolhas mais críticas envolvem as três questões abaixo:
Pessoas
Decisões sobre pessoas são geralmente as mais complexas e desafiantes, pois são afetadas por vínculos emocionais e preferências pessoais e tendem a despertar reações fortes. (...) Como as pessoas reagem a essas decisões em função dos ganhos ou perdas para si próprias, elas deflagram forças políticas poderosas, e é preciso estar preparado para administrá-las
Estratégia
O papel do líder é levar a empresa ao sucesso. (...) A qualidade de suas decisões estratégicas depende de sua capacidade de enxergar à frente, fazer as perguntas certas sobre o futuro e escolher as pessoas certas para apoiá-lo
Crise
As decisões em crises exigem que um líder tenha clareza de seu propósito e de seus valores. É preciso garantir comunicação fluente e transparente sobre os problemas não só na cúpula mas em toda a organização. Manter um bom processo para gerar e analisar informações. E garantir a execução
Os autores mergulham num campo à primeira vista pouco afeito a métricas com a proposta de definir o que faz um bom decisor. Nessa tarefa, eles se debruçaram sobre centenas de estudos de caso ao longo de cinco anos e entrevistaram líderes como Jeffrey Immelt, o celebrado sucessor de Jack Welch na General Electric, Brad Anderson, do gigante do varejo eletrônico americano Best Buy, Jim McNerney, da Boeing, e Alan G. Lafley, da Procter & Gamble. A grande contribuição de Tichy e Bennis é sistematizar os achados dessa radiografia e propor uma metodologia capaz de ajudar qualquer profissional a tomar decisões. A primeira conclusão a que chegaram diz respeito à impossibilidade de acertar sempre -- mesmo os gigantes do mundo dos negócios tropeçam de quando em quando. O que importa é acertar nas escolhas relevantes. A segunda é que boas decisões não são fruto de lampejos ou epifanias, como sugerem os que supervalorizam a intuição. Para os autores, elas resultam de processos estruturados, que requerem investimento de tempo, energia e conhecimento.
Antes de qualquer coisa, é preciso ser capaz de identificar a necessidade da decisão. À primeira vista, isso pode parecer óbvio, mas a história traz poucos exemplos de líderes que conseguiram visualizar problemas -- e dar atenção a eles -- antes que se tornassem intratáveis. Os autores citam como contraponto o caso do falecido general Wayne Downing, ex-chefe das Forças de Operações Especiais dos Estados Unidos. Um dos mais reconhecidos militares da história americana, Downing já estava aposentado quando foi chamado às pressas para servir como principal conselheiro da Casa Branca e coordenador do combate ao terrorismo após o atentado de 11 de setembro de 2001. Morto em 2007, Downing costumava usar um termo alemão para explicar o que muitos chamavam de seu "instinto certeiro": fingerspitzengefühl (numa tradução literal, "sentir pelos dedos"). Era a maneira de o general dizer que para decidir é preciso ter experiência -- e sobretudo aprender com cada episódio.
Nessa complexa tarefa de separar trivialidades do que interessa, a obra propõe três temas que jamais devem escapar ao radar dos executivos: pessoas, estratégias e crises. As decisões realmente vitais nas empresas costumam girar em torno de algum deles. No topo da lista de importância, dizem os autores, estão as referentes a pessoas, por seus desdobramentos em toda a administração. Seriam também as mais desafiantes, já que envolvem fatores emocionais e idiossincrasias. Líderes bem-sucedidos investem tempo e energia para formar um time comprometido com seu projeto. Ao assumir o desafio de revigorar a Procter & Gamble, em 2000, Alan G. Lafley passou dois anos reavaliando os 250 principais executivos para definir a equipe capaz de apoiá-lo. Terminou cortando 30 cabeças. "Eles não tinham um desempenho inadequado", afirmou o executivo, que fez o valor de mercado da centenária companhia subir 60% nos últimos oito anos. "Mas não seriam capazes de contribuir para levar a empresa para o futuro."
DECISÕES SOBRE ESTRATÉGIAS também requerem o melhor dos líderes, uma vez que erros e acertos nessa área logo se refletem no desempenho acionário. Nesse caso, a recomendação é sempre monitorar o ambiente para detectar com antecedência oportunidades e ameaças -- e acertar a hora de mudar o rumo. Quando Jeffrey Immelt assumiu a GE, em 2001, sem sinais de problemas aparentes, ele soube antecipar a hora de investir pesado em novas tecnologias. Elegeu dez novos negócios de atuação -- como nanotecnologia -- e fez várias aquisições nessas áreas. Uma delas foi a compra, em 2004, da gigante inglesa de diagnósticos e biociência Amersham, por 10 bilhões de dólares. No mesmo ano, Immelt disse a um grupo de alunos de MBA em Michigan: "Nunca a definição da estratégia correta foi tão importante quanto agora. Boa execução e boas operações não garantem o sucesso de uma companhia com falhas na estratégia."
Outro que teve perspicácia em definir o momento de mudar o rumo da compa nhia foi Brad Anderson, presidente da Best Buy, líder no varejo de eletrônicos nos Estados Unidos, com vendas de 36 bilhões de dólares. Em 2002, depois de anos brilhando na bolsa, as ações da empresa começaram a patinar. Anderson percebeu que a convergência entre entretenimento, informática e eletrônicos estava atraindo novos concorrentes para seu território e não esperou que os prejuízos se aprofundassem. Com base na observação dos consumidores, decidiu por um reposicionamento radical da empresa, que transformou uma cadeia focada em produtos -- com políticas semelhantes para todas as lojas, independentemente de locação e perfil da clientela -- numa organização altamente segmentada. Ao descobrir, por exemplo, que as mulheres são responsáveis diretas por 65% das compras e influenciam quase 90% delas, Anderson fez com que a empresa repensasse tudo em função desse tipo de consumidor. Hoje, as lojas com mais vendedoras mulheres apresentam os melhores resultados. A Best Buy, que há quatro anos ocupava a segunda colocação entre as companhias especializadas no varejo de eletrônicos nos Estados Unidos, tornou-se a líder e agora tem o triplo do tamanho de sua principal concorrente.
Tichy e Bennis alertam que nem o mais sábio dos líderes está livre de ser assombrado por crises -- o terceiro tema da lista dos executivos de sucesso. Para entender a dinâmica das decisões nesses contextos, eles entrevistaram militares e outros profissionais habituados a lidar com situações de emergência. Concluíram que não é possível deixar para decidir quando a crise já se instalou -- é preciso estar previamente preparado para ela. Assim como enfermeiras e bombeiros contam com protocolos para guiá-los em várias situações, executivos precisam de uma plataforma que os balize na hora do aperto. Essa plataforma é a visão de futuro da empresa -- o projeto da organização que os líderes pretendem construir e os valores em que acreditam. "Não importa seu tipo de processo decisório (...), sem integridade pessoal não há como tomar decisões de qualidade", aconselham.
Eles ilustram o argumento com o escândalo da Boeing, em 2003, denunciada por compra ilegal de documentos da concorrência e por tentativa de corrupção em licitações da Força Aérea americana. Convocado para assumir a empresa no auge da crise, Jim McNerney, líder experiente que já havia dirigido a 3M, fez a diferença com seu projeto para reerguer a companhia. Em vez de continuar negando a responsabilidade da Boeing e protelando as negociações com a Justiça, McNerney optou por assumir o erro de seus antecessores e fechar um acordo. Preferiu o prejuízo das multas milionárias ao custo invisível dos danos para a reputação da Boeing.
Essa decisão também serviu como uma mensagem poderosa para mudar a cultura da organização e reposicioná-la para o futuro -- o que encerra outra lição destacada pelos autores. Se administradas de forma estruturada e transparente, tomadas de decisão são oportunidades valiosas para criar ciclos de aprimoramento. Não apenas para os executivos, mas para as organizações que eles comandam.
Fonte: Por Selma Santa Cruz, in portalexame.abril.com.br
As decisões mais difíceis
Segundo os autores, as escolhas mais críticas envolvem as três questões abaixo:
Pessoas
Decisões sobre pessoas são geralmente as mais complexas e desafiantes, pois são afetadas por vínculos emocionais e preferências pessoais e tendem a despertar reações fortes. (...) Como as pessoas reagem a essas decisões em função dos ganhos ou perdas para si próprias, elas deflagram forças políticas poderosas, e é preciso estar preparado para administrá-las
Estratégia
O papel do líder é levar a empresa ao sucesso. (...) A qualidade de suas decisões estratégicas depende de sua capacidade de enxergar à frente, fazer as perguntas certas sobre o futuro e escolher as pessoas certas para apoiá-lo
Crise
As decisões em crises exigem que um líder tenha clareza de seu propósito e de seus valores. É preciso garantir comunicação fluente e transparente sobre os problemas não só na cúpula mas em toda a organização. Manter um bom processo para gerar e analisar informações. E garantir a execução
Os autores mergulham num campo à primeira vista pouco afeito a métricas com a proposta de definir o que faz um bom decisor. Nessa tarefa, eles se debruçaram sobre centenas de estudos de caso ao longo de cinco anos e entrevistaram líderes como Jeffrey Immelt, o celebrado sucessor de Jack Welch na General Electric, Brad Anderson, do gigante do varejo eletrônico americano Best Buy, Jim McNerney, da Boeing, e Alan G. Lafley, da Procter & Gamble. A grande contribuição de Tichy e Bennis é sistematizar os achados dessa radiografia e propor uma metodologia capaz de ajudar qualquer profissional a tomar decisões. A primeira conclusão a que chegaram diz respeito à impossibilidade de acertar sempre -- mesmo os gigantes do mundo dos negócios tropeçam de quando em quando. O que importa é acertar nas escolhas relevantes. A segunda é que boas decisões não são fruto de lampejos ou epifanias, como sugerem os que supervalorizam a intuição. Para os autores, elas resultam de processos estruturados, que requerem investimento de tempo, energia e conhecimento.
Antes de qualquer coisa, é preciso ser capaz de identificar a necessidade da decisão. À primeira vista, isso pode parecer óbvio, mas a história traz poucos exemplos de líderes que conseguiram visualizar problemas -- e dar atenção a eles -- antes que se tornassem intratáveis. Os autores citam como contraponto o caso do falecido general Wayne Downing, ex-chefe das Forças de Operações Especiais dos Estados Unidos. Um dos mais reconhecidos militares da história americana, Downing já estava aposentado quando foi chamado às pressas para servir como principal conselheiro da Casa Branca e coordenador do combate ao terrorismo após o atentado de 11 de setembro de 2001. Morto em 2007, Downing costumava usar um termo alemão para explicar o que muitos chamavam de seu "instinto certeiro": fingerspitzengefühl (numa tradução literal, "sentir pelos dedos"). Era a maneira de o general dizer que para decidir é preciso ter experiência -- e sobretudo aprender com cada episódio.
Nessa complexa tarefa de separar trivialidades do que interessa, a obra propõe três temas que jamais devem escapar ao radar dos executivos: pessoas, estratégias e crises. As decisões realmente vitais nas empresas costumam girar em torno de algum deles. No topo da lista de importância, dizem os autores, estão as referentes a pessoas, por seus desdobramentos em toda a administração. Seriam também as mais desafiantes, já que envolvem fatores emocionais e idiossincrasias. Líderes bem-sucedidos investem tempo e energia para formar um time comprometido com seu projeto. Ao assumir o desafio de revigorar a Procter & Gamble, em 2000, Alan G. Lafley passou dois anos reavaliando os 250 principais executivos para definir a equipe capaz de apoiá-lo. Terminou cortando 30 cabeças. "Eles não tinham um desempenho inadequado", afirmou o executivo, que fez o valor de mercado da centenária companhia subir 60% nos últimos oito anos. "Mas não seriam capazes de contribuir para levar a empresa para o futuro."
DECISÕES SOBRE ESTRATÉGIAS também requerem o melhor dos líderes, uma vez que erros e acertos nessa área logo se refletem no desempenho acionário. Nesse caso, a recomendação é sempre monitorar o ambiente para detectar com antecedência oportunidades e ameaças -- e acertar a hora de mudar o rumo. Quando Jeffrey Immelt assumiu a GE, em 2001, sem sinais de problemas aparentes, ele soube antecipar a hora de investir pesado em novas tecnologias. Elegeu dez novos negócios de atuação -- como nanotecnologia -- e fez várias aquisições nessas áreas. Uma delas foi a compra, em 2004, da gigante inglesa de diagnósticos e biociência Amersham, por 10 bilhões de dólares. No mesmo ano, Immelt disse a um grupo de alunos de MBA em Michigan: "Nunca a definição da estratégia correta foi tão importante quanto agora. Boa execução e boas operações não garantem o sucesso de uma companhia com falhas na estratégia."
Outro que teve perspicácia em definir o momento de mudar o rumo da compa nhia foi Brad Anderson, presidente da Best Buy, líder no varejo de eletrônicos nos Estados Unidos, com vendas de 36 bilhões de dólares. Em 2002, depois de anos brilhando na bolsa, as ações da empresa começaram a patinar. Anderson percebeu que a convergência entre entretenimento, informática e eletrônicos estava atraindo novos concorrentes para seu território e não esperou que os prejuízos se aprofundassem. Com base na observação dos consumidores, decidiu por um reposicionamento radical da empresa, que transformou uma cadeia focada em produtos -- com políticas semelhantes para todas as lojas, independentemente de locação e perfil da clientela -- numa organização altamente segmentada. Ao descobrir, por exemplo, que as mulheres são responsáveis diretas por 65% das compras e influenciam quase 90% delas, Anderson fez com que a empresa repensasse tudo em função desse tipo de consumidor. Hoje, as lojas com mais vendedoras mulheres apresentam os melhores resultados. A Best Buy, que há quatro anos ocupava a segunda colocação entre as companhias especializadas no varejo de eletrônicos nos Estados Unidos, tornou-se a líder e agora tem o triplo do tamanho de sua principal concorrente.
Tichy e Bennis alertam que nem o mais sábio dos líderes está livre de ser assombrado por crises -- o terceiro tema da lista dos executivos de sucesso. Para entender a dinâmica das decisões nesses contextos, eles entrevistaram militares e outros profissionais habituados a lidar com situações de emergência. Concluíram que não é possível deixar para decidir quando a crise já se instalou -- é preciso estar previamente preparado para ela. Assim como enfermeiras e bombeiros contam com protocolos para guiá-los em várias situações, executivos precisam de uma plataforma que os balize na hora do aperto. Essa plataforma é a visão de futuro da empresa -- o projeto da organização que os líderes pretendem construir e os valores em que acreditam. "Não importa seu tipo de processo decisório (...), sem integridade pessoal não há como tomar decisões de qualidade", aconselham.
Eles ilustram o argumento com o escândalo da Boeing, em 2003, denunciada por compra ilegal de documentos da concorrência e por tentativa de corrupção em licitações da Força Aérea americana. Convocado para assumir a empresa no auge da crise, Jim McNerney, líder experiente que já havia dirigido a 3M, fez a diferença com seu projeto para reerguer a companhia. Em vez de continuar negando a responsabilidade da Boeing e protelando as negociações com a Justiça, McNerney optou por assumir o erro de seus antecessores e fechar um acordo. Preferiu o prejuízo das multas milionárias ao custo invisível dos danos para a reputação da Boeing.
Essa decisão também serviu como uma mensagem poderosa para mudar a cultura da organização e reposicioná-la para o futuro -- o que encerra outra lição destacada pelos autores. Se administradas de forma estruturada e transparente, tomadas de decisão são oportunidades valiosas para criar ciclos de aprimoramento. Não apenas para os executivos, mas para as organizações que eles comandam.
Fonte: Por Selma Santa Cruz, in portalexame.abril.com.br
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